Page 119 - 3M A ALMA ENCANTADORA DAS RUAS
P. 119

– Assine você o seu nome por extenso! dizia o guarda.


               O poeta detento hesitava, punha as iniciais e, por baixo, entre parêntesis, escrevia o nome. As
               iniciais  têm  que  vir  fatalmente,  são  o  complemento  necessário  ao  fim  da  obra,  Por  quê?  E
               misterioso, mas verdadeiro.


               Os assuntos escolhidos pelas iniciais superiores da detenção abrangem  todas as modalidades
               do sentir. Como há plagiários – o Antônio, crime de ferimentos, que se intitula autor da modinha
               Nasci para te Amar, – há simbolistas que escrevem coisas destas:


               Pobre flor que mal nasceste, fatal
               Foi a tua sorte, que o primeiro
               Passo que deste com a morte deste.
               Deixar-te é coisa triste. Cortar-te?
               É coisa forte, pois deixar-te com vida
               É deixar-te com a morte.


               Há também poetas eróticos, o Chico Bentevi, autor do poema Os Amores de Carlos:


               Chiquinha abriu sorrindo
               A porta da sua alcova
               E Carlos foi logo indo
               Com a sede...


               Uma sede excessiva! Há poetas descritivos, trovadores simples,  cançonetístas  ocasionais, todos
               com um sentimento insistente: são patriotas e sofrem injustiça porque nasceram brasileiros.


               O  preso  Carlos,  por  exemplo,  que  se  assina  Carlos  F.  P.  Nas  suas  trovas  é  insistente  a
               preocupação de que está preso porque é brasileiro. Escolho na sua considerável obra poética uma
               modinha cheia de mágoas:


               Meus senhores, venham ouvir
               Do meu peito uma canção
               Tirada por um condenado
               Na casa de detenção.


               Às mágoas segue-se o estribilho.


               São martírios que se passam
               Sofrendo profunda dor
               Ser preso e condenado
               Por vingança é um horror.


               Se  os martírios fossem  enormes, era natural  que  o Petrarca novo não compusesse  quadras;
               mas Carlos F. P. é feroz e continua:
   114   115   116   117   118   119   120   121   122   123   124