Page 62 - 2M A INTRUSA
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– Quem informou a senhora?! – perguntou Feliciano, para não dizer que sim
nem que não.
– Alguém... Ela tem dias certos para sair?
– Sai com D. Glória nas segundas-feiras...
– Que bem me pesa! Mas além dessas vezes?
– Nas quartas-feiras, à noitinha...
– Sozinha?
– Sozinha.
– Precisas acompanhá-la de longe, uma dessas vezes, e vir dar-me o
resultado da tua espionagem... Deus me perdoe! mas é para bom fim!
– Não posso...
– Hein?!
– Nas quartas-feiras o patrão está em casa; é o dia em que os amigos vão
jantar e jogar com ele, e sou eu que sirvo...
– O demônio prevê tudo! Ela não recebe visitas?
– Não, senhora...
– Estás comprado por ela! Deu-te bola!
– A mim?! não! que a Feliciano Ermelindo Braga ela não engana... nem
enrola! É muito esperta, mas eu também não sou tolo...
– Feliciano, preciso que estejas sempre de olho vivo e vigiando a casa da tua
antiga senhora. Lembra-te de como ela era tua amiga e tão condescendente!
– Não me esqueço...
– Se não te esqueces, dize a verdade: Argemiro não fala com essa mulher?
– À minha vista, não, senhora...
– Julgas que se falem?...
A baronesa parou, envergonhada. O negro começou:
– Anteontem, mal o patrão saiu, eu entrei devagarinho na sala de visitas e vi
D. Alice espiando, para o ver, por detrás da cortina... Outra vez entrei no escritório e
ela estava encostada no cofre...
– No cofre! É bom verificar sempre se o teu patrão se esquece de fechar o
cofre...
– Não era com o sentido no cofre, não, senhora; ela tinha tirado da parede o
retrato de D. Maria e estava olhando de perto para ele!...
– Que sacrilégio! com o retrato de minha filha nas mãos!
– Já por duas ou três vezes eu pilhei-a assim... parece que ela tem inveja...
ou ciúme...
– Por que não contou isso ao seu patrão?
– Deus me livre! Seu doutor parece que está enfeitiçado... não admite que a
gente diga nada. Também, ela pode fazer o que quiser! Desde que aquela senhora
entrou lá em casa, não fui mais senhor de arrumar uma camisa do patrão nas
gavetas, nem de mexer nos seus papéis. Eu tenho de levar o tabuleiro da roupa
para perto da cômoda e é ela quem ajeita tudo. Outro dia pareceu-me, não afirmo,
vê-la pôr um raminho verde embaixo das camisas de meia... A senhora sabe que há
certas artes de feitiçaria que só o diabo as entende... ela depois fecha tudo a
chave... Quem poderá livrar o patrão?
– O anjo custódio de minha filha! Feliciano, consta-me que ela ama um moço
pobre e que o encontra de vez em quando. Fala a verdade... ele não vai lá nunca?
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