Page 57 - 2M A INTRUSA
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perpetuidade do amor e na perpetuidade do voto. Que era o casamento, então? um
contrato quebradiço, sujeito a ser violado ao primeiro amuo?
As idéias embaralhavam-se-lhe na cabeça. Ainda na véspera discutira-se à
mesa, em sua casa, a lei do divórcio. E o próprio pai afirmara que ela jamais seria
decretada no Brasil... Interrogou a esse respeito a mãe, que respondeu quase em
segredo:
– Eles estão olhando para nós... disfarça... não convém falar nisso agora... A
Marianinha já me conheceu... não fosse eu a mulher do ministro... verás como me
abraça!
Assim aconteceu.
Pelos fins do almoço, a Marianinha atirou o guardanapo para a mesa e,
arrastando o marido, correu a falar à Pedrosa.
– Petronilha! – exclamou ela num arranco enternecido.
A Pedrosa levantou-se com um sorriso cerimonioso e um ar de quem não
atinava com o nome da outra...
– Não se lembra da Marianinha Serpa! das Irmãs? O diabrete azul, como me
chamavam?
– Ah! sim!... o diabrete azul... lembro-me! Desculpe-me... mas estava tão
longe!...
– Mesmo depois disso encontramo-nos várias vezes em casa do...
Mas a Marianinha interrompeu-se para apresentar o marido.
Pedrosa apresentou, por sua vez, a filha, e os outros voltaram para o seu
lugar; faltava-lhes o café.
– A vida é uma comédia... – comentou a ministra. – Vá a gente fiar-se... Eu
não te disse? Viu que tínhamos acabado e não quis deixar-nos sair sem se
apresentar. E agora teremos de ir cumprimentá-los. Mas vão esperando que lhes
ofereça a casa... não por mim, que afinal não desgosto dela... A Marianinha é
pianista, entretém; mas por causa da sociedade!
Reuniram-se depois, passeando ao longo do aqueduto; era preciso fazer
horas para descer. Marianinha tinha vivacidade, falava muito. O marido colhia
avencas que Sinhá deixava cair dos dedos distraídos. À hora da partida, o casal,
obsequioso, ofereceu a Sinhá uma caixa de passas de pêssego do Rio Grande,
lembrança acabadinha de chegar da sua terra.
Logo que o trem se pôs em movimento, a Pedrosa suspirou de alívio. Que
dia!
E, abrindo a caixa de pêssegos, contemplou-os com aprovação e disse:
– A única coisa boa do dia! Vê como estão bem arranjadinhos e como são
bonitos.
O fabricante tem arte... estes lacinhos de fita estão bem dados...
E ela, antes de fechar a caixa, cheirou os pêssegos.
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