Page 55 - 2M A INTRUSA
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                         – Não há nenhuma mais patriótica. Mas advirto-te que não deves alcunhar de
                  manias as minhas opiniões...
                         – Mamãe desculpe...
                         – Olha! a casa dele é aquela... é bonita... é própria... repara! Será tua...
                         – Já reparei, mamãe!...
                         – O único inconveniente é a filha...
                         – E ele não gostar de mim! – acrescentou Sinhá.
                         – Queiras tu! Para mim isso seria até um estímulo. Sempre gostei de vencer
                  dificuldades...
                         – Eu sou muito mais fraca...
                         – Deixa isso por minha conta...
                         – Mamãe!...

                         Sinhá fez-se vermelha e não conseguiu dizer mais nada. Aquela palavra dita
                  em tom de súplica parecia tê-la engasgado. Estava com os olhos cheios de água.
                         A Pedrosa continuou:


                         – Trabalharei para a tua felicidade, como tenho trabalhado para a felicidade
                  de teu pai. Digo-te isto só a ti e exijo que o não repitas a ninguém! É uma lição de
                  experiência, que te deve aproveitar. Infelizmente, no mundo só os espertos
                  alcançam bom lugar. Quem não tiver cotovelos, não se meta nas multidões...
                         – Outro adágio, mamãe?
                         – Não é, mas pode servir... O padre Assunção ainda há de fazer o vosso
                  casamento; e quero-lhe então ver a cara! Acha o pateta tão justo que o amigo
                  esgote a mocidade a choramingar pela mulher defunta!
                         – Deve ser bom ser chorada assim!
                         – Qual o quê! nem a outra vê nada! Ela já em vida parece que não via grande
                  coisa... Era tão vaga... tão vaporosa!
                         – Bonita?
                         – Hum... Delicada... Precisamos arrancá-la do coração de Argemiro.
                         – Deixe-a... Não devemos guerrear os mortos!
                         – Nem nos deixar vencer por eles. Endireita o teu chapéu... repara para o
                  meu... está bem?
                         – Está bem...

                         O carro rodou ainda alguns minutos. Quando chegaram à estação, a Pedrosa
                  recomendou ao cocheiro que as viesse esperar às quatro horas, e subiram para o
                  trem que estava a partir.
                         Sinhá, perturbada com as teorias da mãe e procurando uma das
                  extremidades do banco, voltou o rosto para fora e fez toda a viagem olhando para o
                  mato. A Pedrosa não interrompeu o silêncio; também ela precisava recolher-se,
                  arregimentar as idéias, preparar a sua cena...
                         Às onze horas, no jardim do hotel das Paineiras, não havia ninguém.
                         A sombra das árvores derramava-se silenciosa sobre mesinhas nuas. Só
                  numa estavam restos de aperitivo em dois copos. A Pedrosa calculou logo que
                  aquele vermute tivesse sido ingerido pelo encarregado dos negócios da Inglaterra –
                  e olhou com simpatia para os cálices sujos...
                         Sinhá seguira até a extremidade do jardim e olhava para diante, para o vale
                  despido de neblinas, resplandecendo no azul do dia. Entretanto, a Pedrosa


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