Page 52 - 2M A INTRUSA
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                         – Minhas senhoras...
                         – Acabamos de receber a sua bênção e viemos esperá-lo para darmos esta
                  esmolinha aos seus pobres...
                         – Meus ou dos outros, todos os pobres me merecem a mesma consideração.
                  V.as Ex.as devem tê-los também...
                         – Repele então o nosso oferecimento?! – perguntou a Pedrosa, desapontada.
                         – Não tenho esse direito. Somente, se me permitirem... eu ensinarei a uma
                  das minhas velhinhas o caminho da sua porta, e a esmola será, então, dada
                  diretamente, mais agradável a ambas...
                         – Isso não obsta... darei outra esmola à sua velhinha!


                         A Pedrosa continuava de mão estendida; e como o padre não a aceitasse
                  logo, ela disse, com a sua costumada vivacidade:


                         – O sr. padre Assunção desconfia de nós!... não crê, por certo, na sinceridade
                  da nossa simpatia. Tem sempre relutância em aceitar as nossas esmolas!
                         – Engana-se, minha senhora, engana-se! Não posso recusar o que não é
                  para mim!... Todavia, desculpem-me a teimosia, a pessoa a quem eu destinaria esse
                  dinheiro procurá-las-á amanhã. Posso morrer de um momento para o outro... é bom
                  que conheça as suas benfeitoras...
                         – Morrer! Quem fala nisso, ainda tão moço!


                         Ele sorriu com ironia, sem responder.

                         – Diga-me, que fim levou o nosso amigo Argemiro? Não há quem o veja!...
                  Não sei quem me disse tê-lo visto há dias com a filha... ela ainda mora com a avó?
                         – Sim, minha senhora...
                         – Então ele vive sozinho... absolutamente sozinho?...
                         – Sozinho.
                         – Que barbaridade!... Aquela ovelha está tresmalhada do seu rebanho... não
                  lhe parece, padre Assunção?
                         – Ao contrário, Argemiro, consagrando-se à saudade da sua mulher, está bem
                  escudado contra os perigos do mundo... Mas, minhas senhoras, perdoem-me V.as
                  Ex.as estar a entretê-las aqui, com este sol!
                         – Ao contrário, eu...


                         Mas o padre apressou-se no cumprimento e as duas senhoras não insistiram
                  na conversa, percebendo que ele tinha uma preocupação qualquer.
                         Ficaram as duas ainda alguns segundos no alto da escada, vendo a longa
                  figura seca e angulosa do padre atravessando, a grandes pernadas, o jardim.

                         – É um homem difícil de conquistar... já não sei quantas esmolas lhe temos
                  dado, não sei quantos convites lhe temos feito... parece antipatizar conosco...
                         – Se eu fosse a senhora não dava mais nada, nem o tornaria a convidar para
                  ir lá a casa. Por ser padre não deve ser grosseiro...
                         – É o melhor amigo de Argemiro... Compreendes que o não convido só pelos
                  seus belos olhos.
                         – Ah...

                         A Pedrosa olhou para a filha com certo espanto.

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