Page 40 - 2M A INTRUSA
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                         O negro sorriu, meneou a cabeça e calou-se.

                         – Que temos? – indagou o barão.
                         – Uma carta do Argemiro; pede-me que não me esqueça de mandar Maria no
                  sábado!
                         – Pois lá a levarei.
                         – Não pode ser. Vou no domingo com ela à Tijuca; já está isso decidido.
                         – Tijuca! Que idéia é essa?
                         – É uma idéia como outra qualquer! Estou sempre como os caracóis metida
                  em casa, e quando falo em sair lá vem tudo abaixo!
                         – Estimo que saias; mas que diabo! Vai noutro dia à Tijuca e deixa a pequena
                  ir ver o pai no sábado, como se combinou.
                         – Há muitos sábados; neste ela não poderá ir. Ele que venha jantar conosco
                  no domingo. Eu vou jantar à Tijuca com a minha neta e voltarei às quatro horas para
                  casa. É uma promessa.
                         – O Argemiro pode ficar sentido...
                         – Que fique. Eu preciso mais da neta que ele da filha. Lá tem outras
                  consolações...

                         O Feliciano sorriu e aprovou com a cabeça. O barão levantou-se e foi para o
                  escritório responder ao genro. Antes mesmo que a baronesa perguntasse qualquer
                  coisa, o Feliciano resmungou:

                         – Aquela casa já não parece a mesma... se a senhora visse! Até me dá
                  saudades de quem está no céu!... Pobre de quem morre!


                         A baronesa sufocou o desejo de indagar do criado aquilo que mais queria, e
                  recomeçou a trabalhar, limitando-se a oferecer:


                         – Entre, Feliciano; vá lá dentro tomar uma xícara de café.
                         – Obrigado; tomei lanche lá em casa antes de sair... apesar de que agora
                  anda tudo muito contadinho...
                         – Isso é bom. O tempo não está para estragos...
                         – Sim, mas poupa-se de um lado para se gastar do outro; afinal, para o patrão
                  as despesas talvez sejam maiores... D. Alice tem uma récua de parentes pobres...
                  Para a gente às vezes o pão não chega, entretanto não bate bicho-careta na porta
                  que ela não dê do bom e do melhor do armário. Até vinho.
                         – Até vinho! – exclamou inconscientemente a baronesa; e logo, reprimindo-se:
                         – A caridade é aconselhada por Deus...
                         – Mas deve começar por casa... A senhora não diga nada ao patrão, porque
                  ele agora é só: D. Alice na terra e Deus no céu!
                         – Ah...
                         – A senhora sabe que eu sempre fui um empregado de confiança, que punha
                  e dispunha de tudo como entendia; pois hoje não posso mover uma palha, que não
                  me tomem satisfação. Ela, com o seu modo de santinha, faz tudo quanto lhe dá na
                  cachola! Eu não gosto de falar, mas... há certas coisas... ontem não afirmo, mas
                  pareceu-me que D. Alice trazia no peito um alfinete...


                         A baronesa pousou a costura nos joelhos e levantou os olhos para o negro.


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