Page 22 - 2M A INTRUSA
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                         No patamar da escada, o sogro do Argemiro, barbeado de fresco, com o seu
                  corpo franzino dentro de brins bem alvejados e o boné de seda preta seguro na mão
                  fina e nervosa, sorria à espera dos hóspedes, a quem abraçou.


                         – Mamãe?
                         – Espera-os na sala do meio. Entrem.


                         Argemiro aprendera com a mulher a chamar a baronesa de mamãe;
                  percebendo agora quanto aquele título comovia o coração da velha, continuava a
                  dispensá-lo de bom grado. Era como se a alma da morta lhe passasse pelos lábios
                  todas as vezes que dizia essas duas sílabas amadas.
                         A baronesa era uma senhora gorda, alta, de lindos olhos negros e cabelos
                  completamente brancos.
                         Tinha as faces flácidas, a carne do pescoço descaída, a boca larga, a testa
                  curta e ainda roubada pela espessura das sobrancelhas escuras. Cosia sentada em
                  uma cadeira de balanço, ao lado de uma mesa redonda, coberta de um pano escuro
                  e onde floria em um vaso um ramo de crisântemos pálidos.


                         – Bem-vindos sejais! – exclamou ela com a sua voz forte, de contralto.

                         Argemiro beijou-lhe a mão e sentou-se a seu lado. Caldas entreteve-se a
                  conversar com o barão, que, pedida a vênia, cobrira com o boné de seda os seus
                  cabelos brancos e encaracolados.

                         – Então, meu filho, como acha sua filha?
                         – Forte... muito alta!
                         – Cresce de dia para dia! Se não vivesse no campo, com esta liberdade, não
                  sei que seria... Precisa ralhar com ela; está muito voluntariosa...
                         – Tem a quem sair...
                         – A mãe era um cordeirinho...
                         – Mas a avó é enérgica. E eu...
                         – Você é um homem. Sua mulher puxava toda ao tipo do pai; Gloriazinha saiu
                  mais a mim... olhe para aquelas sobrancelhas!...
                         – Parecem uns bigodes! – retorquiu Argemiro para fazer zangar a filha. E
                  depois de a beijar nos olhos: – E a respeito de estudos?
                         – Isso! fale-lhe nisso! É uma vadia de força... o avô não se cansa de a chamar
                  e de ensinar-lhe as lições. Mas santos de casa...
                         – Pois chamemos os de fora. Vai buscar os livros, Glória.
                         – Ora, papai... depois... eu...
                         – O que ela quer é andar como os cabritos, aos saltos e correrias... eu, enfim,
                  consinto nisso, porque com aquele crescimento não deve haver sujeição... Graças a
                  Deus, ela tem uma saúde de ferro.
                         – Por isso mesmo precisa ter outros modos... se a puséssemos em um
                  colégio?

                         Pelos olhos da baronesa passou a sombra de um desgosto e ela disse:


                         – Se quiserem matá-la...

                         O barão protestou:

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