Page 17 - 2M A INTRUSA
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                         – Não é feia aquela senhora, mas veste-se muito mal...

                         Benjamim, confirmando:


                         – Realmente, não tem gosto... usa umas cores muito espantadas...

                         Argemiro sorriu por dentro. A pobre da Vieirinha tinha um pecado: ser casada
                  com um ministro, cuja pasta apanhara no ar quando vinha atirada às mãos do
                  Pedrosa!
                         Argemiro, sem retirar o binóculo:


                         – Então, Benjamim, você gostou muito do primeiro ato?
                         – Absolutamente!
                         – Homem feliz...
                         – Por quê?!
                         – Porque pode gostar absolutamente de alguma coisa... quando para toda a
                  gente tudo no mundo tem restrições...
                         – Pois olhe, – acudiu a Pedrosa sem poder disfarçar uma pontinha de inveja;
                  – pela sua insistência em olhar para a Vieirinha, dir-se-ia que ela, ao menos para o
                  senhor, não tem restrições.


                         A Pedrosa tinha jeito para dizer as coisas mais duras como se as tivesse
                  fervido em mel. Falou rindo. Benjamim riu-se também e o advogado respondeu com
                  um suspiro:


                         – É que aquela senhora não permite com facilidade que a gente a veja de
                  perto...
                         – Sim?! Deve ser para que não lhe vejam os defeitos... ou talvez tivesse
                  estado num convento. A propósito, minha filha deixa amanhã definitivamente o
                  colégio das Irmãs de Sião. Vou buscá-la a Petrópolis. Estou velha, com uma filha já
                  moça!... Sábado quero apresentá-la aos meus amigos. Ela tem grande predileção
                  pelo sr. Dr. Argemiro!


                         Notou então o advogado que a Pedrosa o olhava com uma expressão
                  diferente, como se lhe visse na cara pela primeira vez qualquer coisa
                  desconhecida...
                         Intrigava-o aquilo, mas não achou a explicação até ao fim da visita; Benjamim
                  atrapalhava-o. Em que pensaria a Pedrosa?...
                         Ao sair do camarote, sentiu-se agarrado no corredor pela mão do marido, que
                  o reteve, apresentando-o ao conselheiro Isaías e ao Dr. Sebrão, a quem alcunhou
                  de Demóstenes brasileiro.
                         Argemiro ouvira já o colega, num dos seus mais famosos discursos no
                  Senado.
                         O conselheiro Isaías aprovou o cognome de Demóstenes dado ao Sebrão,
                  lamentando que o Rio de Janeiro não tivesse, como a formosa Atenas, o gosto fino
                  pela palavra, tão desbaratada aqui, e não considerasse a política como uma das
                  artes superiores... Também eles conheciam o Dr. Argemiro Cláudio e sabiam que ele
                  escrevia atualmente um livro jurídico de extraordinário interesse...
                         Pedrosa, ufano da amizade dos três, resplandecia de orgulho.


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