Page 20 - 2M A INTRUSA
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                         – Talvez faça falta...

                         Era dela. Argemiro, ao entregar-lhe o leque, notou-lhe um movimento de
                  alegria mal disfarçada. Voltou a sentar-se e Caldas instou:

                         – Influi teu sogro a vender as suas terras em Minas. O Barreto pediu-me para
                  organizar uma colônia suíça, para a indústria dos laticínios... e convém lhe adicionar
                  às dele as terras do barão. Dão-lhe resultado?
                         – Filho, não sei. Meu sogro é um homem calado e eu fujo de mostrar
                  interesse por questões de dinheiro. Mas onde diabo vais tu arranjar suíços?!
                         – À China, talvez... que pergunta! Irei à Suíça, homem!
                         – Sempre arranjas uns negócios!
                         – Nunca os procuro. Eles entram por seus pés em minha casa; aí, ou os
                  recebo ou atiro-os pela porta afora. Fica certo que negócios procurados não
                  prestam. Não há nada como um sujeito passar por homem rico, para enriquecer... O
                  próprio indivíduo chega até a iludir-se e a ficar mais bonito... Conheces maior volúpia
                  que a do dinheiro, senhor absoluto do mundo todo? Só o que é bom e caro dá
                  prazer...

                         Argemiro sorriu, lembrando-se do lequezinho quebrado, e do gesto de
                  contentamento que fizera a dona ao reavê-lo. Pobrezinha...
                         Caldas, por ter confiança no amigo, entrou a falar-lhe baixo da sua
                  cooperação nos relatórios do Vieirinha, ainda maior trabalho do que tivera com os
                  relatórios do Teobaldo, quando ministro da fazenda...


                         – Dize-me cá, – atalhou Argemiro. – Em que disposição está o presidente a
                  respeito do Pedrosa, sabes?
                         – O burro do Pedrosa vai ser ministro.


                         Argemiro riu-se; Caldas retomou o fio das suas confidências interrompidas.
                         O trem corria de estação em estação, com os seus guinchos ensurdecedores.
                  Uma criança chorava no colo da mãe aflita; um grupo de rapazes amarelos e
                  desdentados falava de eleições do Clube Riachuelo, ao pé de uma senhora de
                  cabelos grisalhos, bem vestida, e que viajava só.
                         Lá fora a paisagem estendia-se larga, banhada de sol escaldante. Um véu
                  fino de pó dourava a atmosfera. Laranjeiras pequenas, de grandes frutos dourados,
                  alegravam aqui e acolá um ou outro ponto dos campos mal tratados, onde em
                  gramados secos trilhas barrentas descreviam linhas tortuosas.


                         – Isto é desconsolador... – observou Argemiro, apontando para a extensa
                  pradaria, onde em vários trechos se agrupavam casinhas feias.
                         – E este trem poderia rolar entre pomares cheirosos. O Brasil é a terra da flor
                  esquisita e da fruta saborosa. De um lado e de outro destas estradas, se tivéssemos
                  camponesas e agricultores de bom gosto, veríamos, Argemiro, lindas orquídeas
                  suspensas na galharia de árvores frutíferas. Olha bem para aquilo! É preciso não ter
                  absolutamente gosto nem instinto, para se fazer uma cerca assim, de paus tortos,
                  aqui no país do bambu. Do lindíssimo bambu! Ah! o japonês! que povo feliz e
                  aproveitador... Vou lembrar ao Barreto instalarmos aqui uma colônia de japoneses,
                  com a condição de fazerem eles mesmos as suas casas e trazerem muitas musmés
                  bonitas...

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