Page 12 - 2M A INTRUSA
P. 12

www.nead.unama.br




                         – Tanto melhor; parece-me que nos entenderemos. Todavia, desejaria, repito,
                  que me desse algumas informações a seu respeito. Como se chama?
                         – Alice Galba.
                         – Galba... tenho idéia de ter conhecido na minha infância um velho com esse
                  nome... um botânico, se me não engano...
                         – Era meu avô...
                         – Então seu pai...
                         – Meu pai morreu há dez anos...

                         Argemiro puxou o relógio. Era a hora do bonde; levantou-se apressado,
                  apanhando a pasta e o chapéu.

                         – A senhora veio tão tarde! E temos ainda uma coisa a combinar: o
                  ordenado?

                         A moça levantou-se com timidez.


                         – O senhor dará o que entender...
                         – Ora essa! Eu não sei.
                         – Eu também não... É a primeira vez que me emprego...


                         Argemiro pressentiu sinceridade naquela confissão e olhou para a moça. Mal
                  percebeu, através do véu, um rosto magro e pálido.
                         "Parece-me feia..." – pensou ele consigo, com uma pontinha de desgosto; e
                  logo alto:


                         – Onde poderei mandar preveni-la?
                         – Eu virei, quando determinar, saber a sua resposta.
                         – Se quer ter esse trabalho... Venha então quinta-feira. Somente peço-lhe
                  mais algumas informações sobre os seus antecedentes e que fixe o seu ordenado.

                         Ele já se mostrava impaciente, caminhando para a porta, como a despedi-la.
                  Ela fez uma reverência tímida e saiu.
                         Quando Argemiro chegou à rua, com a sua pasta pejada de papéis, viu Alice
                  subir para o bonde e notou, como o seu criado, que ela levava as botinas rotas e
                  tinha os tornozelos delicados.
                         O diabo da rapariga fizera-o perder um tempo precioso, e talvez inutilmente.
                  Quem sabe? Talvez aparecesse outra mais jeitosa. Tudo lhe desagradava nesta,
                  desde os ombros encolhidos até as botinas esfoladas...
                         Quando Argemiro voltou a casa para jantar, encontrou o padre Assunção, que
                  vinha trazer-lhe notícias de Maria da Glória.

                         – Tua filha pediu-me que te viesse hoje mesmo dizer que está com muitas
                  saudades tuas. Que diabo fazes, que a não vais ver?
                         – Bem sabes em que consumo as horas... uma estupidez! É tão longe aquilo
                  e minha sogra fecha tão cedo a casa!... Ah, estou morto por trazer minha filha, ao
                  menos uma vez de quinze em quinze dias, para jantar comigo, encher esta minha
                  casa triste de riso e de alegria. Como a achaste?
                         – Magnífica, muito corada, forte! A avó exasperada porque ela não lhe pára
                  no estudo. Quando eu cheguei estava ela encarapitada no muro, apanhando as

                                                                                                          11
   7   8   9   10   11   12   13   14   15   16   17