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                  vaporoso, as malvas benfazejas, o limonete perfumado e mil outras, confundindo-se
                  nos tons azulados ou verdes das suas ramagens bem alimentadas.
                         Olhava para as rosas pensando nas papoilas, quando o Feliciano lhe disse
                  atrás das costas, com uma vozinha ciciada:

                         – Sá baronesa tá chamando o senhor...


                         O barão não quis olhar para o negro e subiu para o quarto, abafando um
                  suspiro.
                         Que mais?



                  Capítulo XIX

                          – Assunção!
                         – Argemiro...
                         – Fizeste bem em vir esperar-me; estou doido por conversar contigo;
                  disseram-te lá em casa que eu chegaria hoje?
                         – Naturalmente... eu não poderia adivinhar!... olha a tua mala... Pareces-me
                  magro...
                         – Um pouco...
                         – Boa viagem?
                         – Regular... Como está a minha gente? E tua mãe?
                         – Dá a mala ao carregador... Conversaremos em caminho.
                         – Tens razão; e eu estou com pressa de chegar a casa. Decididamente,
                  abomino os hotéis. Que desconforto! que aborrecimento! que noite! Ah! Assunção,
                  nunca o meu cantinho me pareceu tão delicioso como nesta ausência. Isto deve ser
                  velhice... os meus ossos não se afazem a outros colchões, nem a minha cabeça a
                  almofadas que não sejam as costumadas. Hás de acreditar que sofri de insônias em
                  S. Paulo? Depois eu não tinha notícias! Glória escreveu-me duas cartinhas; tu
                  nenhuma... Nenhuma! inacreditável o teu descuido! Meu sogro escreveu-me
                  também, mas só falava na mulher e na neta. É verdade, o Caldas também me
                  escreveu... Referia-se a ti...
                         – Tiveste então cartas de todos!...

                         Saíam da Central. Argemiro acenou para um carro.


                         – De todos... mas incompletas... Só tu me poderias dizer tudo; és íntimo de
                  minha casa, mais íntimo do que eu! Compreendes que eu fugi!
                         – Por que, homem?!
                         – Nem sei porque... medo do barulho, da intriga... de não poder conter o meu
                  mau humor. Estava enervado, aborrecido... Depois arrependi-me. Não tinha que
                  fazer; bocejava pelas ruas... o hotel indispunha-me comigo mesmo. Estou como o
                  caracol, – não posso sair da minha casa sem perder a vida... Acredita: até do cheiro
                  da minha casa eu tinha saudades! Parece-me incrível que um sujeito de vida bem
                  organizada goste de viajar. Tu nunca viajaste. É uma maçada! Mas que diabo, tu
                  não me dizes nada!
                         – Não me dás tempo...
                         – Tens razão; mas estou cheio até a raiz dos cabelos. Mal conversei durante
                  a viagem; estava com a língua entorpecida. Este cocheiro é um lorpa... não toca os
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