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moléstia e desesperava, não sabendo que alvitre tomar. Um dia pelos outros, chegava
em casa semi-embriagada, escorraçando o filho e trazendo algum dinheiro. Não
confessava a ninguém a origem dele; em outros mal entrava, beijava muito o pequeno,
abraçava-o. E assim corria a cidade. Numa destas correrias passou pela porta do
conselheiro, que era o marido de Dona Laura. Estava no portão, a lavadeira, parou e
falou-lhe; nisto, viu aparecer a sua antiga patroa numa janela lateral. " - Bom dia
minh'ama," - "Bom dia, Gabriela. Entre." Entrou. A esposa do conselheiro perguntou-lhe
se já tinha emprego; respondeu-lhe que não. "Pois olha, disse-lhe a senhora, eu ainda
não arranjei cozinheira, se tu queres..."
Gabriela quis recusar, mas Dona Laura insistiu.
Entre elas, parecia que havia agora certo acordo íntimo, um quê de mútua
proteção e simpatia. Uma tarde em que Dona Laura voltava da cidade, o filho da Gabriela,
que estava no portão, correu imediatamente para a moça e disse-lhe, estendendo a ma
- o: "a bênção" Havia tanta tristeza no seu gesto, tanta simpatia e sofrimento, que aquela
alta senhora não lhe pôde negar a esmola de um afago, de uma carícia sincera. Nesse
dia, a cozinheira notou que ela estava triste e, no dia seguinte, não foi sem surpresa que
Gabriela se ouviu chamar.
- O Gabriela!
- Minh'ama.
- Vem cá.
Gabriela concertou-se um pouco e correu à sala de jantar, onde estava a ama.
- Já batizaste o teu pequeno? perguntou-lhe ela ao entrar.
- Ainda não.
- Porque? Com quatro anos!
- Porque? Porque ainda não houve ocasião...
- Já tens padrinhos?
- Não, senhora.
- Bem; eu e o conselheiro vamos batizá-lo. Aceitas?
Gabriela não sabia como responder, balbuciou alguns agradecimentos e voltou
ao fogão com lágrimas nos olhos.
O conselheiro condescendeu e cuidadosamente começou a procurar um nome
adequado. Pensou em Huáscar, Ataliba, Guatemozim; consultou dicionários, procurou
nomes históricos, afinal resolveu-se por "Horácio", sem saber porque.