Page 46 - 2M A INTRUSA
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– Não... escolheremos juntos...
Argemiro abriu a caixa e logo Assunção suspirou de alívio vendo reluzir as
pedrarias dos anéis e das pulseiras.
– Ela tinha muitas jóias... gostava de brilhantes... e a Glória, por enquanto,
ainda não pode usar brilhantes... – disse Argemiro.
Colares, broches e pulseiras iam sendo retirados do cofre, com a maior
atenção, num silêncio comovido.
Quantas vezes a dona lhes sorrira e os deslumbrara no meio daqueles
adereços?
Não brilhava tanto uma estrela, como os seus cabelos de ouro coroados por
aquele diadema... os anéis faziam-lhe saudades dos seus dedinhos pálidos e
meigos.
De repente, Assunção gritou com júbilo:
– Este!
– Este? É também de brilhantes...
– São uns diamantinhos modestos. E depois representa uma avezinha
inocente, símbolo da primavera... leva-lhe esta andorinha, e coloca-a tu mesmo no
peito de tua filha, em nome de sua mãe...
– Mas que tens tu? estás trêmulo, com os olhos rasos d’água!
– Abraça-me, meu velho. Também eu tive saudades de Maria... que queres?
– Eras o seu confessor... e agora, com franqueza, dize-me: um homem que
foi casado com um anjo daqueles, pode jamais pensar em outra mulher?
– Pode; e pensarás e hás de ser feliz. Quem sabe? talvez mais!
Argemiro olhava para o padre, com certo espanto.
– Agora fecha a caixa e apressa a tua toalete. Lembra-te que estou em jejum
e com fome...
– Vai descendo... Eu irei ter contigo num minuto.
Momentos depois sentavam-se à mesa. Alice armara uma cestinha de flores e
frutos, entrelaçando-as com umas pontas de renda. Argemiro apontou-as com o
dedo:
– Lembras-te do que te disse lá em cima? Gostos finos... rendas... flores...
Padre Assunção sorriu, acenou que sim, desdobrou o seu guardanapo e
começou:
– Um pouco de política: ouvi dizer que o...
Um criado interrompeu a frase, servindo os hors d’oeuvre; mas logo depois a
palestra enveredou afoitamente pelos labirintos da Câmara e do Senado.
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