Page 125 - 2M A INTRUSA
P. 125
www.nead.unama.br
visse ali; ocultei-me. Foi no meu esconderijo que assisti à cena de humilhações a
que me referi. Não tinham bastado as minhas afirmações; o cego apalpou
nervosamente os dedos, os pulsos, as orelhas da moça, à procura da jóia
comprometedora... A paralítica pediu-lhe guloseimas. Enjoara tudo. Morria de
fraqueza... Agora, senhora baronesa, creio que não preciso dizer mais nada...
O barão levantou-se:
– Luiza, não te parece que devemos pedir perdão a essa senhora?
Mas a mulher não respondeu. Parecia petrificada no seu lugar, com os olhos
fitos no retrato mudo da filha.
Capítulo XXI
Chegara a hora da prestação de contas. Argemiro escrevia à secretária,
quando Alice entrou na sala. Como da primeira vez que se falaram, ela ficara contra
a claridade, encolhida no seu vestido de lã barata, escura, e com o véu descido até
o queixo.
Estava pronta para sair; esperava ordens...
Argemiro remexeu nos papéis. Abriu um caderninho dos assentamentos do
mês, que ela lhe mandara somado e com saldo.
Sem saber porquê, Argemiro sentia-se embaraçado, e foi com certa timidez
que convidou a moça a sentar-se.
– Estou bem...
– Não; sente-se.
– Obrigada...
Ela parecia querer ficar em pé, pronta para fugir!
Ele gaguejou:
– Então...
Evidentemente não sabia como principiar.
De repente:
– Os seus cadernos estão numa ordem admirável. Realmente eu nunca
imaginei que uma senhora entendesse tanto de contas... é um guarda-livros!
Contudo... parece-me encontrar aqui um pequeno engano...
Alice aproximou-se, com um arrepiozinho de susto.
Ele, indicando-lhe uma cadeira, a seu lado:
– Tenha a bondade de somar...
Ofereceu-lhe a pena, que ela mesma molhou no tinteiro.
Estavam sós. A casa em silêncio.
124