Page 7 -
P. 7

- Não, sou de Canavieiras.

                        - Como? fez ele. Fale um pouco alto, que  sou surdo, - Sou  de  Canavieiras,  na
                  Bahia, insisti eu.  - Onde fez os seus estudos?

                        - Em São Salvador.

                        - Em onde aprendeu o javanês? indagou ele, com aquela teimosia peculiar aos
                          velhos.

                        Não  contava  com  essa  pergunta,  mas  imediatamente  arquitetei  uma  mentira.
                  Contei-lhe que  meu pai era javanês. Tripulante de um navio mercante, viera ter à Bahia,
                  estabelecera-se nas proximidades  de Canavieiras como pescador, casara, prosperara e
                  fora com ele que aprendi javanês.

                        - E ele acreditou? E o físico? perguntou meu amigo, que até então me ouvira
                          calado.

                        - Não sou, objetei, lá muito diferente de um javanês. Estes meus cabelos corridos,
                  duros e grossos e a minha  pele basané  podem dar-me  muito bem o aspecto de um
                  mestiço de malaio...Tu sabes bem que, entre nós, há de tudo: índios, malaios, taitianos,
                  malgaches,  guanches,  até  godos.  É  uma  comparsaria  de  raças  e tipos de fazer inveja
                  ao mundo inteiro.

                        - Bem, fez o meu amigo, continua.

                        - O  velho,  emendei  eu,  ouviu-me  atentamente,  considerou  demoradamente  o
                  meu físico, pareceu que me julgava de fato filho de malaio e perguntou-me com doçura:

                        - Então está disposto a ensinar-me javanês?

                        - A resposta saiu-me sem querer: - Pois não.

                        - O senhor há de ficar admirado, aduziu o Barão de Jacuecanga, que eu, nesta
                  idade, ainda queira aprender qualquer coisa, mas...

                        - Não tenho que admirar. Têm-se visto exemplos e exemplos muito fecundos... ?
                          .

                        - O que eu quero, meu caro senhor....

                        - Castelo, adiantei eu.

                        - O que eu quero, meu caro Senhor Castelo, é cumprir um juramento de família.
                  Não  sei  se  o  senhor  sabe  que  eu  sou  neto  do  Conselheiro  Albernaz,  aquele  que
                  acompanhou Pedro I, quando abdicou. Voltando de Londres, trouxe para aqui um livro
                  em língua esquisita, a que tinha grande  estimação.  Fora  um  hindu ou siamês que lho
   2   3   4   5   6   7   8   9   10   11   12