Page 302 - 9F O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO
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chateado me senti, mas o que fiz mesmo foi tirar os pedaços do envelope e botar
tudo no bolso do meu sobretudo. Não serviam mais para nada, mas não tive
coragem de jogá-los fora. Aí entrei no parque. Puxa, que escuridão!
Moro em Nova York desde que nasci e conheço o Central Park como a
palma da minha mão, porque, quando eu era garoto, costumava ir muito lá andar
de patins ou de bicicleta. Mas tive um trabalhão danado para encontrar o
laguinho naquela noite. Sabia exatamente onde ele ficava - bem pertinho do
Central Park Sul e tudo - mas mesmo assim não conseguia encontrar o
desgraçado. Eu devia estar mais bêbado do que pensava. Andei pra cá e pra lá, e
o lugar ia ficando cada vez mais escuro e mais soturno. Não encontrei vivalma
durante o tempo todo que fiquei no parque. Antes assim, porque se desse de cara
com alguém provavelmente teria levado o maior susto. Aí, finalmente, achei o
lago. Estava metade congelado e metade não. Mas não vi nenhum pato por ali.
Dei a volta na droga toda do lago - aliás, quase caí dentro dele uma vez - mas
não consegui ver um único pato. Achei que, se houvesse algum por ali, devia
estar dormindo ou coisa parecida, bem pertinho da margem ou no gramado. Foi
aí que quase caí dentro d'água. Mas não encontrei nenhum.
Acabei me sentando num banco, num canto um pouquinho menos escuro.
Puxa, ainda estava tiritando como um filho da mãe e na parte de trás da cabeça,
apesar de eu estar de chapéu, tinha uma porção de pedacinhos de gelo. Isso me
preocupou. Achei que provavelmente ia apanhar uma pneumonia e morrer.
Fiquei imaginando milhões de chatos indo ao meu enterro e tudo. Meu avô de
Detroit, aquele que fica lendo alto o nome das ruas quando a gente anda numa
porcaria dum ônibus com ele, e minhas tias - tenho umas cinquenta tias - e todos
os nojentos dos meus primos. A tropa toda ia estar lá. Estavam todos lá quando o
Allie morreu, a cambada toda de imbecis. Tenho uma tia imbecil, que tem mau
hálito, que não parava de repetir que ele estava tão sereno no caixão. O D. B. é