Page 107 - 9F O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO
P. 107
por ali, espichado no escuro, procurando não pensar na Jane e no Stradlater
dentro da porcaria do carro do Ed Banky. Mas era quase impossível. O problema
é que eu conhecia a técnica daquele sujeito. Uma vez nós saímos com duas
garotas, no carro do Ed Banky, ele no banco de trás com a pequena dele, e eu na
frente com a minha. Puxa, o cara tinha uma classe bárbara. Ele começou a cantar
a menina, com uma vozinha mansa e sincera pra burro, como se, além de um
sujeito simpático, fosse também bom e sincero. Quase vomitei, só de ouvir. A
garota só fazia dizer: "Não, por favor. Não faz isso não, por favor". Mas o
Stradlater continuava a passar a cantada com aquela voz mais sincera do que a
do Abraão Lincoln, e no fim houve um silêncio horrível no banco de trás. Foi
realmente embaraçoso. Não acredito que ele tenha feito o serviço na garota
naquela noite, mas chegou perto. Perto mesmo.
Ainda estava deitado ali, fazendo força para não pensar, quando escutei o
Stradlater voltar do banheiro e entrar no quarto. Dava para ouvir perfeitamente
enquanto ele guardava aquela escova e aquele pente imundos e depois abria a
janela. O imbecil era tarado por ar puro. Aí, pouco depois, apagou a luz, sem
nem ao menos dar uma olhadela para ver onde eu estava.
Lá fora, a rua estava até deprimente. Não se ouvia nem um carro passando.
Fiquei me sentindo tão podre e soninho que me deu até vontade de acordar o
Ackley.
- Ackley - chamei, numa espécie de cochicho, para que o Stradlater não me
ouvisse através das cortinas do chuveiro. Mas ele não ouviu.